Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

sábado, 17 de janeiro de 2009

obrigada deus


por essa sequencia coreografada de eventos. conversas. eventos dentro de mim. entendimentos.


primeiro ele que mora no mato e diz que somos luz, que a paz está dentro, que o corpo é só encarnação da energia, do espírito, que somos o universo, que no mar não há gotas, que é preciso estar só e olhar para dentro de si, que a cidade é um monstro onde é muito difícil olhar para dentro de si em meio a toda a perturbação das placas e da mentes, que depois de olhar para dentro de si é preciso olhar para fora e olhar, olhar muito, e também fazer escolhas.

depois ela, que fala da terra, dos pés na terra, da luz da lua, de estar lá e entender dentro de si, de que cada um tem que estar em sintonia com a natureza em que vive e que no fundo do poço tem mola.

então penso que o homem também é da natureza e que se a cidade veio do homem, ela também pode ser natureza, ela também pode ser bela, que ela não é um monstro a ser combatido e sim uma criatura a ser salva. a cidade também  será bela se o homem a fizer bela.

por fim entra a moça humilde e me fala das coisas da terra de quem viveu em cidade porque aí nasceu. fala do amor sincero por todas as coisas vivas, fala do homem enfeiando a cidade por ignorância, por falta de respeito pelo que existe. e fala de tudo com o sorriso nos olhos não de quem se abre para qualquer pessoa, mas de quem já está aberto para o mundo sem saber disso, e por isso justamente. e essa acaba sendo a que mais me toca, a que fala das coisas da cidade, da cidade que ela percebe e da cidade que ela gostaria.

e aí eu recupero um fio da meada que fora perdido há tempos. e explico a essa moça aquilo em que eu esquecera acreditar. e fico bem. de repente há lugar no mundo outra vez, de repente não estou mais só, de repente não tenho mais medo nem de ter medo.


eu entendo, ou procuro entender, tudo aquilo de que me falam. mas nem tudo que a gente entende vivencia. e justamente por isso somos diferentes e capazes de ocupar os diferentes lugares a serem ocupado no mundo.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

pelô

gente demais circulando,
gente demais desejando,
gente demais não podendo,

gente demais abordando,
gente demais se esbarrando,
gente demais se temendo,

gente demais desfrutando,
gente demais se mostrando,
gente demais se escondendo.

se escondem como ele diz, por baixo dos óculos, atrás da janela, debaixo do guarda-sol.

é pra gente se sentir culpado?


a gente às vezes quer fingir que não vê

a gente às vezes quer abrir o peito

a gente às vezes quer fumar e beber

a gente às vezes tem medo


é pra gente se sentir culpado?


medo do desconhecido; do que não se pode compreender nem aceitar; nem ignorar nem solucionar.


eles vêm e vêm com eles os olhos e as bocas e os pedidos quase gemidos que são intimações. a história, as pedras, os sinos. a história lá no chão quente de pedra, as correntes e as barras nas janelas. o tempo todo eles vêm.


a gente quer entender o nosso lugar no mundo. e o nosso lugar diante disso, em relação a isso, em relação a todas as coisas. o nosso lugar em relação a esse lugar.

o que você leva?

o que você traz?

o que você divide?

o que você cobra?


ninguém tem mérito nem tem culpa de ter nascido em lugar nenhum. o que todo mundo tem é o mesmo direito de existir e de explorar essa existência com aquilo que o universo oferece. e o universo oferece igual pra todo mundo que nasce e existe. mas na hora em que alguém se convence de que merece mais, de que pode mais... o universo não se sobrepõe a nós, o universo não pune, o universo não tira. e nós que aqui estamos, e que há muito alteramos o curso das coisas, nós manipulamos o universo nos sobrepondo, punindo, tirando.

nós? reconhecer-se (assumir-se) nesse nós? envergonhar-se? sentir-se ridiculamente desorientado diante do jogo sendo jogado ali, a dois palmos, por todos os lados, ter que tomar parte nesse jogo ainda que pela recusa.


sentir medo, depois sentir curiosidade, depois sentir compaixão, depois sentir enjôo.


dessa vez não adianta fumar nem beber. escrever também de nada adianta. é preciso entender e assumir o lugar no mundo. e o lugar diante disso, em relação a isso, em relação a todas as coisas. o lugar em relação a este lugar.