Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

quarta-feira, 30 de julho de 2008

o que eu vou fazer se nao tiver nada pra fazer

é inacreditável como a questão do tempo me perturba. aproveitar o tempo. nao perder tempo. fazer valer o tempo. dar valor ao tempo.

aaargh, que vontade que eu sinto de não fazer nada! não apenas por uam tarde inteira, eu queria não fazer nada uma semana inteira, um mês inteiro, que nem a velha meditando na rede. eu queria meditar na rede dois meses até ter a iluminação do que tenho que fazer.

a gente realmente vive como se estivesse se preparando para alguma coisa. alguma coisa muito importante que está por vir e para que se tem que estar bonito, culto, instruído, bem-sucedido, cheio de amigos e boas histórias, feliz. parece que nada tem um fim em si mesmo, momento nenhum é pleno, tudo pe em função desse grande clímax que nao chega nunca.

nunca chegará. o grande clímax da vida na Terra é a morte do corpo. e o mistério do que vem depois. melhor contar que não venha nada e se vier é lucro. mas o agora é agora. é contínuo e ainda sim é fechado. é um momento único e precioso que se desenrola no tempo, não existem outros momentos, a única coisa que existe é o real, o agora, o presente.

complexa demais, essa questão, filosófica demais. mas uma coisa é simples e ainda assim a gente custa a aceitar: é preciso fazer em cada momento aquilo que se realmente quer. não aquilo que dará mais prazer ou trará mais frutos, não aquilo que é certo. todos esses conceitos são bastante controversos. é preciso fazer aquilo que se quer, lá no fundo. porque no fundo todos nós queremos algo bem específico, na realidade, no fundo a gente sempre sabe o que é. plenitude para mim é poder fazer exatamente o que eu quero, sem frustrações, sem culpa e sem receios. o segredo da felicidade, portanto, está no que se quer. quando se quer coisas simples, é simples ter o que se quer.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Não consigo mais me concentrar em nenhuma atividade ativamente passiva mais dificilzinha. Clarifico: atividades ativas são aquelas em que o indivíduo se engaja em um esforço criativo e/ou produtivo com resultados objetivos. Atividades passivas são aquelas em que o indivíduo consome o produto das atividades ativas de determinado produtor. Ativitades ativamente passivas são aquelas em que o indivíduo se engaja em um esforço para consumir objetos. Assistir a uma emissão de televisão é uma atividade passiva. Ir até o cinema é uma atividade ativa de outra ordem (seu resultado, a locomoção é de objetividade discutível). Assistir ao filme, quando legendando, é uma atividade ativamente passiva de pequeno esforço, já que o espectador deve se engajar na leitura das legendas e administrar sua interferência na fruição da experiência cinematográfica. Ler um livro teórico ou técnico é uma atividade ativamente passiva que requer um alto esforço de engajamento na leitura, através de interpretação e memorização do conteúdo do texto.

Ou seja: não consigo mais ler um livro teórico. Se for em português, mastigadinho, num momento de extrema tranquilidade de espírito, talvez até desça rápido, redondo, mas só de ser em inglês, esquece. Divago nas questões da língua, da gramática inglesa, parará parará, do que o parágrafo falava mesmo? Quando me dou conta, não faço idéia do que estava escrito numa página inteira.

Fico horas assistindo a filmes, perco o sono com desenhos e colagens, escrevo como quem vomita, viro noites com o nariz enfiado em romances fantásticos. Qual a dificuldade e se ater a temas que, quando comentados em sites, palestras e listas de discussão, são interessantíssimos? Livros em cujos perfis da Amazon eu provavelmente passei mais tempo do que em suas páginas.


Acendo então um incenso, coloco as melhores músicas no player e deixo o verbo escorrer, deixo as mãos deslizarem pelo teclado, pelo quarto, pelas canetas, as páginas com toque de pele, as lembranças, os amigos, os amantes, as redes, os cigarros, isqueiros, controles, os lençóis. A imaginação vaga ainda mais longe. Os assuntos preferidos, a novela emocional da sua intimidade, a saga romântica de cada dia. Depressão, retomada, espiritualidade, erotismo, criatividade, compaixão, ambição, ansiedade, sofreguidão, apetite, rebeldia. Cada viagem tinha não só suas intrincadas esrtuturas de atividades, como também ainda mais complexas sequências emocionais.
As matrizes se misturavam, as âncoras se perdiam, tudo se tornava uma coisa só. Todos os seus escritos, suas noites, seus desenhos, suas colagens, suas músicas preferidas, suas experiências místicas. O conhecimento adquirido, especialmente sobre si, o conhecimento desenvolvido, aprofundado. O prazer de estar só, de estar só sob as estrelas, de haver redescoberto a janela, de haver encontrado quem lhe curaria a carência e descobrir que estava curada, o prazer de saborear as horas, os minutos, ver a natureza acontecer, o tempo passar devagar, o dia nascer e se por. O prazer de contar e ouvir histórias. De se entregar a elas e vivenciá-las a partir do olhar.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

estou de férias. minha mãe viajou. estou aqui sentada na minha cama há dias, fazendo todas essas coisas que eu nunca tinha feito. nunca me ocorrera.
moro neste apartamento há cerca de um ano e meio. acho que hoje foi a primeira vez que eu abri totalmente a janela. isso porque só ontem eu aprendi a olhar por ela e a admirar a vista privilegiada que eu tenho. ontem eu inclusive tirei fotos. hoje eu me sento no escuro e no silêncio e observo. escuto.
está de noite. tarde da noite. madrugada. cedo ou tarde na verdade são categorias muito pessoais. quando alguém me pergunta o que eu tenho feito é um pouco estranho, mais pra eles do que pra mim, responder, nada. mas fazer nada nos últimos dias tem sido muito mais produtivo do que meses de atividades intensas. em primeiro lugar por ter mudado o conceito de produtivo.
houve um tempo em que eu não suportava não ter planos. não saber o que faria nos próximos três dias, semanas, meses. eu tinha sub e super planos, de acordo com as escalas. eu simplesmente não conseguia dormir sem eles. eu sabia o quanto isso era ruim, mas simplesmente não conseguia fazer diferente.
então eu encontrei o plano perfeito: não ter plano. estabeleci um prazo, sub e super prazos. não ter a menor idéia de certas coisas, não me preocupar com outras, não criar expectativas com terceiras. não me cobrar cotas de páginas ou de horas de dedicação a quaisquer atividades. não me prometer metas. não ter objetivos a alcançar, não me esforçar para cumprir cronogramas de aproveitamento do tempo. simplesmente aproveitar o tempo, fazendo o que der vontade a cada minuto.

um pouco diario gráfico, só que com a sua vida. com a sua rotina. conhecer alguém interessante e dias depois não querer mais vê-lo. entrar numa loja e comprar um vestido. sentar-se na grama no aterrro. olhar as estrelas pela janela antes de dormir. entender a letra de uma música. perceber algo especial lá fora. escutar os pássaros. acompanhar uma conversa de estranhos. dormir muitas horas. virar a noite. ir a uma festa. decidir em cima da hora. não tomar banho.

desacelerar.

eu finalmente entendo, cada um deles. com as suas peculiaridades. o viajante desorientado, o hippie das tranças, a rasta da praça, todas essas criaturas lentas e sem ambição. a vida pode ser lenta. o mundo merece ser contemplado. os dias merecem ser imprevisíveis. nós, seres humanos, temos que respeitar nossas escalas, nosso alcance.

ninguém deveria ter que fazer nada de que não sinta vontade.