Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Sabe uma coisa que me incomoda?

Ninguém passa 2 anos e meio solteirando pelo rio de janeiro impune e indolorosamente. A gente passa por tanta coisa maluca e esquisita e tem que aprender a se afirmar e se bastar e se articular de maneira tão independente...

A gente sente isso forte quando conversa com alguém que vive uma realidade completamente diferente. Um casal por exemplo. Não de namorados saltitantes frequentadores da lapa, imagine uma pessoa solteira conversando com um casal desses casadíssimos, que curtem casas em itacoatiara, plantas, clima bucólico. Imagine uma pessoa solteira explicando pro pobre casal espantado os motivos pelos quais gostaria de morar "mais para o centro", ou seja, no meio da confusão urbanóide mesmo.

Pior ainda é conversar com uma outra pessoa solteira, potencialmente interessante, e causar-lhe assombro ou repulsa com a falta de delicadeza das palavras e dos raciocínios, principalmente no que se refere à selvageria das relações entre solteiros lá fora. Sim, porque mesmo quando passam a noite acompanhados, solteiros são solteiros 24hs por dia até que se prove o contrário, ou seja, até que sejam parte de um casal. E solteiros, não importa se estão entre amigos ou assumidamente à caça, solteiros estão sempre alerta, porque estão sempre por sua conta e risco, estão sempre sozinhos. E solteiros, desses muito solteiros mesmo, quando estão entre amigos solteiros, quando falam de sua vida de solteiros podem assustar.


Em inglês, solteiro é single. Single em português também é singular. Singular, único, um só.


A gente adquire cada mania... a gente se acostuma. Acordar e dormir, ficar três dias seguidos sem dirigir a palavra a ninguém quando não se tem aula ou trabalho. Nem se olhar no espelho. Ocupar a cama de ponta a ponta, comer de um jeito esquisito, assoar o nariz e largar os papéis pela casa inteira. Se submeter às maluquices dos outros solteiros que às vezes acabam passando a noite na sua casa etc.


A gente se acostuma a falar no singular o tempo todo. E é uma das piores coisas do mundo, ser sempre eu vou, eu quero, eu acho, eu gosto e nunca nós gostamos, nós achamos, nós queremos, nós vamos...


É complicado que do lado de cá, a grande maioria não está afim de passar pro lado de lá. Do lado de cá tá todo mundo arreganhando os dentes e as unhas mesmo, assumindo a missão de cada sexta feira, aumentar as opções do caderninho sem se deixar envolver por mais que uma diária. De manhã é cada um pro seu lado e beijo na bochecha.


E eu vou me despedindo de 2008 lentamente. Já que à meia noite do dia 31 eu não vou ter ninguém tão especial assim pra me dizer coisas bonitas e promissoras para o ano novo, me assumo enquanto solteira clássica e vou passar por todo o processo e fim de ano das pessoas solteiras, retrospectiva, pensar nos que vieram e nos que foram, na bagunça emocional.


2008 foi o ano mais solteiro da minha vida. Não deu pra chamar ninguém nem de peguete. Um fim de semana com pastel na feira foi o máximo que rolou. Mas teve uma quantidade razoável de histórias pra lembrar, se isso vale de algum consolo. Um amor platônico irracional, um cara que perdeu a graça da noite pro dia, um ex-namorado paranóico, um sujeito pirado que não dizia coisa com coisa, fora uma ou outra trepada ocasional ainda menos significativa.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Que em 2009 não nos falte nada



Semana passada a cidade nos violentou. Contávamos já com um amanhecer romântico, uma última chance de paixonite do ano e quem sabe pelo menos um sábado preguiçoso cheio de sorrisos, mas ao invés disso levamos um susto, depois a raiva, a indignação, o constrangimento, o medo, a despedida de silêncios desconfortáveis. Semana passada a cidade nos levou muito mais que uns trocados, um telefone e um maço de cigarro.


Eu volto sempre à mesma posição, aqui nessa cadeira, olhando por essa janela, o rio de janeiro não é aqui, o rio de janeiro é lá fora onde eu mesma não vejo mas sei que é muito intenso.


Você, de alguma forma, também não está no rio de janeiro. não adiantaria sair por aí te procurando, você também se assustou com a cidade e se recolheu. 


Que venham então as viagens, viajemos pra longe até que deixe de parecer um pesadelo. Porque nisso eu ainda discordo de você, não é acordar e pensar que foi um pesadelo, é passar por cima até do pesadelo.
O tempo é muito maior que a gente, o tempo e o espaço combinados então, podem te revolucionar os sóis. Quem seremos daqui a um, dois, quem sabe quantos meses, até que nos vejamos de novo? Será por vontade ou por acaso contrangedor ou por feliz coincidência? Que nos veremos é certo, afinal, ao sair eu da minha e você da sua toca, ainda estaremos no rio de janeiro, no mesmo rio de janeiro que às vezes nos abusa, às vezes nos dá volta, às vezes nos dá pena, mas que em geral nos apaixona. Mas não se pode prever quem seremos, parte de que seremos, a que ou quem pertenceremos.



Teria sido bom, eu acho. Teria sido melhor que acordar só num sábado cinzento, que dirá então quanto melhor seria que acordar e lembrar do que de fato foi. Infelizes coincidências de vírgulas, de intromissões, de desvios, que nos obrigou a deixar algo faltando. 



Não fomos os únicos a sentir faltarem coisas em 2008. Pra todos os lados que eu olho 2008 foi um ano de grandes perdas, de coisas que ficaram faltando.

E agora vem o turbilhão das festas, das praias, dos transatlânticos, dos fogos de artifício, dos alulcinógenos, das batucadas, do povo cantando ladeira acima e abaixo, das paixões irresponsáveis em língua estrangeira.

Mas se daqui a algum tempo, quando voltarmos ao rio de janeiro, ou quando o rio de janeiro voltar ao normal, se acharmos que isso que ficou faltando ainda parece uma boa idéia, faço votos de que em 2009 não nos falte nada.