Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

terça-feira, 29 de julho de 2008

Não consigo mais me concentrar em nenhuma atividade ativamente passiva mais dificilzinha. Clarifico: atividades ativas são aquelas em que o indivíduo se engaja em um esforço criativo e/ou produtivo com resultados objetivos. Atividades passivas são aquelas em que o indivíduo consome o produto das atividades ativas de determinado produtor. Ativitades ativamente passivas são aquelas em que o indivíduo se engaja em um esforço para consumir objetos. Assistir a uma emissão de televisão é uma atividade passiva. Ir até o cinema é uma atividade ativa de outra ordem (seu resultado, a locomoção é de objetividade discutível). Assistir ao filme, quando legendando, é uma atividade ativamente passiva de pequeno esforço, já que o espectador deve se engajar na leitura das legendas e administrar sua interferência na fruição da experiência cinematográfica. Ler um livro teórico ou técnico é uma atividade ativamente passiva que requer um alto esforço de engajamento na leitura, através de interpretação e memorização do conteúdo do texto.

Ou seja: não consigo mais ler um livro teórico. Se for em português, mastigadinho, num momento de extrema tranquilidade de espírito, talvez até desça rápido, redondo, mas só de ser em inglês, esquece. Divago nas questões da língua, da gramática inglesa, parará parará, do que o parágrafo falava mesmo? Quando me dou conta, não faço idéia do que estava escrito numa página inteira.

Fico horas assistindo a filmes, perco o sono com desenhos e colagens, escrevo como quem vomita, viro noites com o nariz enfiado em romances fantásticos. Qual a dificuldade e se ater a temas que, quando comentados em sites, palestras e listas de discussão, são interessantíssimos? Livros em cujos perfis da Amazon eu provavelmente passei mais tempo do que em suas páginas.


Acendo então um incenso, coloco as melhores músicas no player e deixo o verbo escorrer, deixo as mãos deslizarem pelo teclado, pelo quarto, pelas canetas, as páginas com toque de pele, as lembranças, os amigos, os amantes, as redes, os cigarros, isqueiros, controles, os lençóis. A imaginação vaga ainda mais longe. Os assuntos preferidos, a novela emocional da sua intimidade, a saga romântica de cada dia. Depressão, retomada, espiritualidade, erotismo, criatividade, compaixão, ambição, ansiedade, sofreguidão, apetite, rebeldia. Cada viagem tinha não só suas intrincadas esrtuturas de atividades, como também ainda mais complexas sequências emocionais.
As matrizes se misturavam, as âncoras se perdiam, tudo se tornava uma coisa só. Todos os seus escritos, suas noites, seus desenhos, suas colagens, suas músicas preferidas, suas experiências místicas. O conhecimento adquirido, especialmente sobre si, o conhecimento desenvolvido, aprofundado. O prazer de estar só, de estar só sob as estrelas, de haver redescoberto a janela, de haver encontrado quem lhe curaria a carência e descobrir que estava curada, o prazer de saborear as horas, os minutos, ver a natureza acontecer, o tempo passar devagar, o dia nascer e se por. O prazer de contar e ouvir histórias. De se entregar a elas e vivenciá-las a partir do olhar.

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