Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

sobre nossos filhos

tava eu aqui pensando como eu gosto da minha mãe. e como eu acho que ela vai ser uma boa avó. e como eu vou sentir falta quando ela não estiver mais lá, mas o quanto ela vai em ajudar enquanto estiver...

aí me lembrei de uma coisa que eu tava dizendo pra uma amiga outro dia. que nós somos a geração que vai ver a mutação acontecer. mas nossos filhos é que serão realmente a primeira geração da mutação. nós vimos o computador invadir as casas e os celulares surgirem, ficarem leves, ocuparem todas as bolsas e tornarem-se o principal ícone de um estilo de vida. nossos filhos não serão capazes sequer de conceber esses processos.

um mundo sem computadores e celulares parecerá totalmente jurássico para nossos filhos. como no caso da menininha de 3 anos que levantou no meio do filme pra procurar alguma coisa atrás da tv. o pai achou engraçadinho e perguntou o que ela estava procurando, e ela respondeu "o mouse!". Ainda zapeamos muito a televisão, o computador às vezes é cansativo, poucos de nós ainda preferem descansar os olhos em um bom livro.

esses que estão por vir certamente desenvolverão outros olhos, terão potenciais diferentes diante da tela que encararão desde os primeiros anos de vida. não tenho nenhum dado sobre isso, mas acho provável que uma criança já aprenda a mexer no mouse antes de usar sozinha o peniquinho. lerão o hipertexto desde sempre, na educação fundamental inclusive. se alfabetizarão digitando antes mesmo do treinamento escolar. terão o google e o wikipedia como parceiros desde as primeiras ginganas culturais da colônia de férias via um aparelhinho corriqueiro.

honestamente, me parece assustador e fascinante o desafio que será educar essas crianças tão diferentes de nós, mas ainda assim compreensíveis. elas serão tudo o que hoje sonhamos ser, terão acesso ao que idealizamos por anos dos desenhos de hanna-barbera aos sucessos de bilheteria da ficção cinetífica filosófica.

mas eu me pergunto que família terão esses nossos filhos. me pergunto se serão capazes de conversar com sua avó, se ela será capaz de conversar com eles... se terão pais e primos ou se serão indivíduos vagando soltos, mochileiros cibernéticos sem sobrenome, googleIDs vagando pelas redes sociais sem nenhuma âncora emocional no mundo físico que os rodeia. quanto tempo passam os adolescentes hoje na internet, nos chats de bate-papo, nas redes de relacionamentos? quanto tempo passarão, desde a primeira infância, nossos filhos? quantos de nós passamos mais de nosso tempo livre isolados no trânsito, ou em diversões particulares, com nossos ipods nos ouvidos do que conversando com amigos? quantos amigos virtuais terão nossos filhos? quantas linguas falarão nossos filhos? quantas liguas serão faladas no mundo? serão essas linguas alfanuméricas?

nossa lógica ainda é muito ocidental, nós vimos cair o muro, caírem as torres, caírem as bolsas. nossos filhos, em que contexto político crescerão, de que tratarão suas aulas de geografia? que aulas de história serão dadas, hitória do mundo globalizado? como são hoje as aulas de história na União Européia? e nos Estados Unidos? poderão ser para sempre tão diferentes? deverão ser ainda mais diversas ou assemelhadas? como serão as avaliações em seu equivalente ao nosso ensino médio, como será a universidade que frequentarão?

que tal lhe parecerão nossos pesados notebooks e bidimensionais projeções de cinema? quão irriquietos se sentirão diante da passividade da televisão? que incríveis formas de interação com a máquina em todo o seu processo de aprendizado terão, causando-lhes as mais imprevisíveis desenvolturas...

e volto a pensar como será nossa família. se poderei ver a minha mãe ser a avó que eu sei que ela seria. se meus filhos poderão ter os pais que sempre me faltaram ou se para eles sequer fará falta e ficarei apenas eu, ficará apenas a nossa geração frustrada com a ruptura do que idealizamos perpetuar.


não é para nos angustiarmos com isso. 


há que se andar pra frente, entender os processos e tomar parte. mas que eu me coloco muito curiosa, isso sim.





Um comentário:

André Gavazza disse...

Ah, mas eu acho que esse processo é contínuo. A geração ants da minha tb deve ter qustionado do mesmo jeito ao me ver tão mais acelerado que eles, tão urbano desde o começo, tão à vontade com a televisão, tão menos interessado na família, etc...