Krishna em O Mahabharata [trad. Jean-Claude Carrière]

"Resiste ao que resiste em ti.
Sê tu mesmo"

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

ansiedade, curiosidade

é engraçado isso, eu aqui publicando do alto do décimo primeiro andar, achando que nunca ninguém vai parar pra me ler.

aí alguém pára e lê. e comenta. e eu gosto dos comentários, por isso os comento. 

hoje é véspera de feriado e eu estou trancada num quarto sozinha, experimentando todos os temas novos do gmail. o tédio desfila de tamancos pela casa, dá piruetas em volta da minha cama. eu acendo um incenso, um cigarro, abro um livro, acho a introdução chata, procuro alguma coisa na geladeira, procuro um jogo na internet, faço as contas de que horas eu tenho que acordar, que horas é razoável ir dormir, refaço a lista mental de todas as pedências e me martirizo, pela quinquagésima sétima vez no mesmo dia por tudo aquilo que eu tinha que fazer, que eu gostaria de estar fazendo e que não fiz ainda. a preguiça se espalha pelo chão do quarto e zomba de mim quando eu levanto, dou três voltas pelo apartamento, volto pra cama e acendo de novo o cigarro.

hoje é véspera de feriado e eu estou trancada num quarto sozinha escrevendo sobre isso.

nem em pergunte onde eu queria estar. podemos passar a noite respondendo a essa pergunta, na realidade é isso que eu faço dentro da minha cabeça o dia inteiro. se me pedirem pra relatar, podem escolher entre a versão plausível, que se passa num apartamento com um rapaz nada simpático que eu conheci outro dia, a versão sórdida, que se passa no apartamento de um homem misterioso, a versão romântica, que envolve meu resgate da monotonia por um príncipe encantado que me leva desse mundo absurdo pra viver com ele num lugar maravilhoso cheio de livros e onde eu posso acordar tarde e não pensar em dinheiro e a versão utópica, em que tudo continua exatamente como está, mas fazendo sentido e aí eu consigo finalmente sair do lugar de verdade.

é, ansiedade, curiosidade, vontade de saber quem escreveu. se é alguém a uma distância curta o suficiente que também esteja entediado e queira descer ali e tomar um chope ou se é alguém a muitos e muitos quilômetros de distância e que se for bem humorado vai começar a deixar mais comentários até isso ficar realmente divertido. em breve esse alguém vai começar a virar um personagem, ou vários. pode ser que a cada comentário eu invente que esse anônimo é alguém. pode ser que pra variar um pouco eu idealize esse alguém e o ame no meu mundo de fantasia em que ele um dia se revelará.

ou pode ser que amanhã um colega meu comente, po cara, fui eu que deixei o comentário, não precisava criar todo esse caso, nao era nada demais. 

qualquer comentário anônimo ou assinado, qualquer olhar, gesto, insinuação, qualquer migalha de atenção que me dirijam vira tema para a fantasia. no fim das contas eu sou só uma pessoa entendiada, que gosta da sensação de digitar no seu lap top e passa o dia inteiro inventando o que escrever pra não lembrar das trocentas outras coisas que devia estar fazendo enquanto estou aqui brincado de colunista. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei a idéia de você ficar fantasiando quem eu posso ser. Que a cada dia, pra vc, eu seja um novo personagem. Alguém que transita por todas as fantasias que você cria. Tão real, quanto imaginário. Como o gato de Alice no país das maravilhas. Posso ser alguém que acorda todos os dias com uma agenda lotada a cumprir, alguém que te conhece muito bem, ou que vai ver nunca te viu. Ou posso ser apenas fruto da sua imaginação. Um ser virtual, cujo DNA é uma seqüência binária. Um ser virtual que existe apenas no seu blog, e que volta e meia aprecia seus anseios, e deixa mais ansiedade para você. Que tal criar um pseudônimo pra mim?
A distância também é tão real quanto imaginaria. Tão concreta quanto abstrata.

Você se diz entediada. Não é bem tédio que vejo nos posts que eu já li. Vejo uma vontade de expressar sentimentos que muitos têm vergonha de deixar sair de dentro do coraçãozinho apertado. Às vezes você fala com tanta simplicidade e delicadeza de seus sentimentos, os amorosos mesmo, que imagino uma menina que deseja o príncipe encantado. Não aquele no cavalo branco. Mas alguém que te ame, que possa te oferecer companhia para desbravar esse mundão que você busca descobrir e apreciar cada detalhe, que queira compartilhar uma vida, uma casa aconchegante, ter uma família linda, com filhos saudáveis. Vejo uma Clarice que necessita um mínimo gesto de carinho, um olhar, um pouquinho de atenção com quem possa repartir tudo que se passa em sua vida. Uma Clarice que precisa e gosta disso.

Agora vamos deixar de lado esse papo de analista. Até gosto de psicologia e psicanálise, mas estou longe de entender tudo que se passa no interior de quem quer que seja. Vai ver não sei nem mesmo quem eu sou.

Engraçado, eu aqui descobrindo cada vez mais coisas sobre você e você ai, tentando descobrir o mínimo que seja sobre mim. Hoje eu estava pensando sobre esses meus últimos comentários aqui e sua reação. Me lembrei do filme “Mensagem para você”, com a Meg Ryan e o Tom Hanks. Não pela história em si, mas pela característica de seres anônimos que conversam pela internet, compartilham segredos e nem ao menos vêem o rosto um do outro.

Acho que se eu criar um blog, essa questão das conversas pela internet, dialogar com o outro, sem contato visual, sem a entonação da voz (e a partir disto, interpretar essa entonação do jeito que lhe convir), será um dos temas que comentarei.

Até.